terça-feira, 28 de agosto de 2012

Carta para um amigo.

  De tantas provações que a gente é forçado a passar na vida, a mais terrível delas é a perda de alguém.
  Hoje venho aqui, não pra fazer mais uma homenagem. Okay, talvez sim. Mas também para externar tudo o que vem passando pela minha cabeça desde a segunda-feira, quando eu fiquei sabendo de algo que abalou um pouco o mundo de todos nós.

Meu amigo:

  Eu acordei em uma manhã gelada e chuvosa de uma segunda-feira, nada animada para ir em uma aula nada produtiva. A escola não tem mais tanta graça desde que eu comecei a amadurecer. E eu não tenho mais ninguém que me faça ver a graça de novo.
  Mas voltemos a manhã gelada e chuvosa: um dia que, desde o começo, se sabe que será totalmente sem graça. Acho que senti algo diferente, porque fiz uma coisa atípica: entrei na van e rezei. Um Pai Nosso, um Credo, duas Ave Marias (a mãezinha sempre merece mais). Pedi proteção, e que o dia fosse bom. E dormi novamente (afinal, a gente vai dormir sempre tarde nos domingos).
  Fui acordada pelo Gustavo, me perguntando se poderia me dar uma notícia ruim. Eu disse que podia, pensando em uma possível falta à escola, por parte dele, naquele dia. E as coisas se desenrolaram de um jeito que eu já tinha visto muitas vezes... "Sabe o Michel?" "..." "Sei sim. Que que aconteceu?" "pois é... disseram que ele reagiu a um assalto...".
  Pensei em tantas coisas aquela hora. Jurei que era brincadeira, cheguei a pensar que tu tava no hospital... Mas a notícia era a de que tu tinha falecido.
  Eu ainda choro. Talvez seja fraqueza. Talvez seja o término de algo muito bom, e que eu jurava que ia durar mais. Poxa, cara! Tu ia ser o tio loucão das minhas crianças! A gente ia ter muita história pra contar!
  Eu tive raiva. Primeiro de ti (pô, Michel! Que que tu tava fazendo?!), depois dos caras que fizeram isso contigo, e depois do mundo.
  Fui pra escola tendo pequenos ataques de choro e angústia a cada 20 minutos, intercalados com momentos de calmaria em que eu me perguntava se tinha algo que eu poderia fazer por aqueles que eram mais próximos de ti do que eu. Depois eu lembrava de tudo, e as lágrimas me vinham novamente.
  Tu tem noção de quantas vezes tu foi uma mola pra mim? De quantas vezes tu me animou só de conversar comigo, seja filosofando (eu sei como tu filosofava), seja falando besteria (idem ao anterior), tu levantava o astral de um jeito que só tu conseguia.
  Mas enfim... fomos ao velório. Chegamos cedo. No caminho, relembramos tuas piadas de humor negro (sem bracinho, sem docinho!) e não podíamos não rir. Esperamos até tua chegada (tua? Será que era mesmo tu ali?) e da tua família.
  Não posso deixar de te falar o quanto tu tinha uma cabeça brilhante e um coração de ouro. Tu era incrível, e não, essa não é uma das vezes que falamos bem de alguma pessoa só porque ela morreu. Nós vivíamos dizendo isso: TU É FODA! Só não sei se dizemos pra ti.
  Foi terrível me despedir de ti. Foi terrível tentar confortar tua mãe quando em mim já tava doendo tanto. Foi terrível ver tanta gente ali reunida por um motivo tão bizarro. O Michel morrendo? Não é possível. O cara era indestrutível!
Engenharia Eletrônica, então? Não sabia disso. Aliás, acho que ninguém sabia disso. Engenharia, Michel? Eletrônica, de novo? Eu teria rido da tua cara. E tu também teria rido, pelo mesmo motivo.
  Tu não tem noção, cara, do quanto eu te considero, e do quanto eu te adoro. A gente sofre em silêncio, quando a nossa vontade é de quebrar a cara de um filho da puta desses que faz isso com alguém que, tenho certeza, é insubstituível.
  Já perdi muita gente. Mas dessa vez eu me peguei torcendo pra tu vir puxar meu pé à noite. Assim, quem sabe, eu possa falar contigo de novo.
  Estou escrevendo na esperança de que, de algum lugar, alguma hora dessas, quando te sobrar um tempinho (afinal, o paraíso deve ser muito bacana, mesmo) leia, e lembre de mim, porque eu sei que tu significava mais pra mim do que eu pra ti. Aliás, com todo mundo deveria ser assim.
  Era isso que eu tinha pra dizer de ti. Um cara especial, de excelência.
  Enfim. Espero que tu encontre muitas vaginas perfeitas por aí, porque, afinal "É nesses momentos que tu sente que o teu pau tem valor".
  E te lembra aquela vez na praça? Tudo bem que eu tava bêbada, mas se eu disse que tu ia estar na minha biografia, é porque tu vai estar. E vai mesmo.
  Adeus, Michel. Agora eu sinto que "a ficha caiu" mesmo.
  Tua curta vida valeu mais e foi mais proveitosa que a de muita gente que chega aos 100, por aí.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Com carinho

     De vez em quando, a vida e escolhas me levam a ter um olhar diferente sobre as coisas. Isso acaba por me deixar meio deprimida, mas é um bom exercício de amadurecimento.
    Me utilizando da metáfora da rã no tacho de leite, quem se deixa vencer pelas dificuldades simplesmente afunda. Aquele que luta, porém, de tanto se debater transforma o leite em manteiga, consegue sair fácilmente.
     Às vezes desistimos por coisas tão insignificantes, dificuldades bobas que se tornam um grande iceberg em nossa frente. Somos, a grande maioria de nós, raça humana, fúteis. Reclamamos "de barriga cheia". Nosso maior passatempo é reclamar. Atitudes para mudar, porém, raramente são tomadas...
     Esse fim de semana conheci uma pessoa maravilhosa. É por ela que estou aqui, agora, escrevendo isso (no meio de uma aula, antes que minha memória e inspiração falhem). Uma mulher guerreira, se debatendo no "tacho da vida".
     Filha de uma família de doze irmãos, ela luta contra cânceres (sim, no plural) desde os 35 anos. Venceu três, já. Faz hemodialise a tanto tempo que seu braço, no lugar onde são colocadas as agulhas, apresenta um grande inchaço, um "caroço" de tantas agressões da vida.
     Já fez diversas cirurgias, retirou tireóide. Tem agora uma perna mais curta que a outra, por conta de um "consumo de cálcio" excessivo do organismo. A bexiga diminuiu depois das tantas radioterapias intensivas que fez. Hoje, está esperando uma cirurgia de transplante de rim.
     É a esse indivíduo que dedico o texto de hoje. Melhoras, dona Vânia. O leite já está quase virando manteiga.